quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

A passagem do moço



Me lembro que, moço, eu desejei uma passagem breve, rápida, sem mais surpresas. Era um tempo confuso, mas sem dor alguma. Era um tempo acima de tudo de descobertas, o que viria a perceber somente com o tempo. Acho que foi quando meu mar se amansou, o tempo acalmou, e eu pude olhar um horizonte até bonito. Incerto, claro, como todo "mar a dentro" pode ser. Era minha hora de partir. Hoje, já velho, agradeço à partida, que me tomou como pelas mãos a conduzir para um lugar seguro. O fato é que é preciso saldar: Iemanjá, três pulinhos das ondas, sementes de romã na carteira, como queira. Eu atiro aqui de dentro um pouco da minha saudade, tem doido demais. A sirvo à deusa do mar. É hoje meu mais profundo sentimento, é o que eu mais honestamente tenho a oferecer, é uma das poucas coisas que pra mim ainda tem valor verdadeiro. E tenho certeza que ela saberá usar isso quando for a hora boa. Vamos virar!  

Imagem de LUNAÉ PARRACHO - 2.2.10

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Quem vai lhes contar que é natal?



Caminhando pela rua não tive outro pensamento. Os meninos ali, na rua. Os homens e mulheres também. Talvez lhes conte o jornal que usam pra forrar o chão. Talvez não, talvez alguém venha se redimir dando-lhes sopa, presentes baratos mas nem por isso menos querido, ou então alguma boa ação de épocas especiais. E, no entanto, eles precisam tanto disso! Vendo daqui, do meu conforto de final de ano, o natal parece tão mágico. Fazem parecer. É quando resolvemos que damo-nos um tempo para recomeçar, criamos essa espectativa. E isso nos ajuda tanto! A perspectiva deles de mudança? Talvez trocar o lado da rua para melhor dormir. Talvez lavar as poucas roupas para começar um ano novo de pele limpa. E nessa movimentação toda, na qual todos nós estamos de uma forma ou outra ligados, quem é que vai lhes contar que é natal?

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

De que lado nasce o sol



Seus pés mal começaram a tocar o chão e no entanto bastava erguer os braços que já alcançava as estrelas. Ele nasceu um pequeno dilema, desafiando todas as leis do homem sabido. Amava seu animalzinho mais amado do mundo, um elefantinho cor de rosa (desculpem, mas a imagem é preto e branco), com o qual brincava dia e noite, entre as estrelas, árvores e castelos encantados. Seu mundo fabuloso não tinha nada de inventado, ele era uma infância ideal, um pedaço da vida durante o qual nada é impossível. Juntamente com os dois, todos os sonhos os acompanhavam: eles eram núvens, como as de algodão, a flutuar nessa idade melodiosa. Todos que com eles cruzassem eram abençoados por uma vontade a realizar. Presentes não davam, mas entregavam desejos muitas vezes sublimados. Ah, esses dois! Até hoje, depois de tê-los visto passar - "De que lado nasce o sol, moço", questionavam, eu sei que o sol nasce é do lado de dentro. Saudades. 

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Pequena conversa com Ele


 
Aquela garotinha precisa te contar coisas que sei que sabes. Mas você precisa saber pela oração dela. Sequer ela busca entendimento, mas acalentar o espírito pequenino dela. Precisa de calma, paz, e às vezes isso não chega. Se lhe for dado entendimento para atravessar alguns dias, talvez um pouco de desentendimento ajudaria também, pra ela esquecer tantas coisas que sequer ela mesmo gostaria de se importar. E será em passagens por caminhos estranhos e indevidos que ela Lhe chamará. Portanto, ela pede paz, serenidade e noites bem dormidas para o futuro. Ela já sabe das coisas. Não se importa com aquilo que não se importa com ela, mas já Lhe pede que quando precisar de desentendimento para suportar algumas passagens, que seja assim feito. Em certas horas, o que ela precisará não será luz para passar certos caminhos futuros mas sim um canto macio em seu colo para que lhe conforte e lhe revigore para o próximo dia, mesmo se for feriado.