sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Procurando em todas as direções

Sai, então a caminhar. À tira colo, minha máquina de bolso: queria aquelas pegadas de praia. E por onde eu ia não as via. Muito cedo, verdade, para se laçar coisas dessas, talvez quando praia cheia, quando pessoas acordadas e crianças por ali, correndo para um tempo que elas ainda não aprenderam a entender. Mais de 20 minutos contra o sol, a melhor luz, branca como algodão no céu, daquele que dá vontade de pular mais alto e numa bocada adocicar o resto do dia. Nada. Cheguei a pensar que naquele dia houvesse uma espécie de greve para Iemanjá, algum descontentamento não resolvido, quem sabe. Mais 20 minutos. Outros 20. Mais 10 só, se nada, eu volto. Nada. Fiz-me voltar, lancei uma perna como que cruzasse a outra. Foi então que entendi, mesmo na velhice, que muitas vezes em que tracei um foco, em que objetivei o importante, eu procurava em uma única direção. Me voltei e vi minhas pegadas. Estavam desde sempre ali, esperando...

*Créditos da imagem para verarenm´s.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

EU DECIDI PARADO NÃO VOU FICAR

Aquele lençol, exatamente como se deixa, assim que se acorda ele fica. É o meu, o reconheço, ele não se mexe. E, tal assim como fica, entristece assim que se volta. Ele ali me bate no rosto que companhia eu não tenho. Mas estamos tão acostumados... tanto ele quanto a mim, voltamos como saimos, a diferença é um banho, talvez. Pensamentos aprenderam, de mansinho, a contruir espaço, como pontes entre futuro e minha realidade. Como será quando tudo mudar?

Diz, por essa ponte, que Física preencherá espaços: ondas sonoras, luzes que formam em meus olhos turvos figuras reflexivas de carinho também, talvez. Por quanto tempo se mantém carinho como o meu pelo lençol ali, que deixo assim que se acorda ele fica? Haverá companhia, mas, meu deus, que exista companheirismo! E se uma das partes acordar antes e não houver sono da segunda, qual deve preparar o café? Não o preto, não tomo. Haverá capuccinno para sempre?

E ele, não sendo mais meu, volto arrumado. Que triste para ele, amaciado por quem o não concebeu. Que triste para mim, amaciado por quem não foi concebido. Que triste para a outra parte, até então uma hipótese, uma epífase, uma qualquer. Mas uma que começa a modificar meu sentimento, antes mesmo de amassar primeiro o lençol ou de arrumá-lo para hora mais avançada.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

COM OS PÉS NO CHÃO E A CABEÇA NAS NÚVENS

Com sua coleirinha preferida de onçinha, nuvenzinha minha mais eu fomos caminhar. Travessamos pontes, tiramos os sapatos e pusemos nossos pés nágua dum riacho, enchido por ela mesma. Sempre caminhamos por ai, especialmente em dias turbulentos e em horas que demoram para passar. Faz, quem sabe, a vida um pouco mais ser aceita, diminui desprazeres e aumenta muito nossas coxas, que ficam gostosinhas para serem apertadas de noite, na cama.

E precisa ver como nossas cabeças ficam leves! Nuvenzinha até avoa, às vezes para longe, porque leve se sente poder ir mais pra lá ainda. Eu solto corda, porque eu sei que ela volta. Mas um dia deu que não voltou. Pus tênis macio e fui buscar. Não achei. Emprestei um carro e sai a noite, que é quando nuvenzinha branca se destaca no céu e brilha formosa feito televisão LCD. Estava ela lá, deitada numa lombada com sua amiga, conversando.

Depois desse dia comprei a colera de onçinha, que ela usa porque adorou a cor. Nunca tentei segurá-la perto, mas sei que soa contraditório. Na verdade nossa cordinha é de fio de amor, finíssimo, porque o amor é raro. E delicado como só vendo: se puxar, até de leve, quebra e podemos ir cada qual para seu lado preferido. Eu, talvez, visitaria lugares que me lembram nuvenzinha; ela, quem sabe, deitaria com seus amigos em lombadas por ai...

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

OS PÉS QUE NÃO SABEM ANDAR

Por hora está ainda lá. É quase único: divide o quintal com um coqueiro. Mas o fato de menor importância é que ambos não andam. E isso de certa forma me entristece.

Queria dar pés aos pés de coisas, mesmo os pés de árvores mais simples.

E fico cá eu, pensando em como se ensina pés de coisas a andarem. E quando andarem, que triste fico eu cá, já que vejo em suas folhas o mesmo tempo que meu rosto também já carrega.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

PISANDO ONDE TOCA O ARCOÍRIS

Ouro de tolo é o que não tenho. Muito menos pote cheio deles. Ouro meu é de verdade, e ouro meu não brilha brilhoso, ou é suntuoso, ou pindurricalha por pulsos alheios e pescoços floreados. Ouro meu é servido num pote que busco na saudade, e me enriquece o coração sempre que fico assim, sem tempo ou sem espaço. Ouro meu é pisar onde toca o arcoíris. E é dado sempre que tenho saudade.

Jogue fora este ouro teu, caro amigo. Talvez este não te enriquece tanto como este meu, que lhe é oferecido aos montes. Deves procurá-lo onde ele existe em abundância e é fácil o garimpo, basta um exercício. Mesmo que rocha sólida encontre, garanto que o ouro fica a poucos minutos de uma idéia. E a rocha sempre quebra com o tempo, não com mais nada não.

Tem outro jeito pro garimpo: pega na mão a luz do tempo que já se foi, aproxime e cheira suas vontades: basta compreendê-las. Ponha-as em luz de vela e sopre nela a ausência que te dá. E olhe que dá, bem eu o sei, que tanto as cheiro. Se luz que foi ficou no papel, fica muito mais em carne. Não se sabe porque, mas é na memória que mais forte ficam as fotografias gravadas. Parece que se tornam ouro.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

CHUVA NA PORTA DE CASA

Quando se chega assim em pé de chuva a natureza avisa que pode mais. Mesmo sabendo que sou menos, não dá vontade de tremer as pernas. Eu apenas observo. Por sorte, posso guardar esse momento. Queria que passasse em cima de mim, para eu olhar para cima. Mas passou longe. O suficiente para eu me sentir menor novamente.

Nessa época é comum grandes massas e muita água. Agora um pouco mais, dizem: agravantes que pagamos por não respeitar a natureza. Lembro que quando menino Santiago, de bicicleta, corríamos para entrar embaixo dessas águas doces e geladas. E quando barulho fazia, fazíamos o caminho inverso, e muito mais rápido.

Hoje, passo próximo blindado, com teto e tudo. Sem chance de molhar e sem vontade de ir atrás. Hoje passo sozinho, procurando gotas dessa saudade. O tempo passa marcado pela chuva que se vai e pela luz do dia que se apaga. Mas que fica gravado em pixels e em pequenas coisas dentro do coração que não souberam dar nome ainda.