sexta-feira, 23 de abril de 2010

Onisciência durante um café

Também tenho isso de estar em todo o Tempo. Me acordo velho, passo dia moço, e não quero me deitar, menino que sou, quero continuar na TV. A ordem varia, muda toda manhã, toda tarde, toda noite. Mas sempre estou ali, menino, velho, moço, sem importar a ordem. No café, me vejo no reflexo do vidro, logo ao lado, eu com copo à boca. Mas ali fora, já na mais idade, também sou eu a ver-me dentro menino que estou, segurando uma xicara quente, com o cuidado que aprendi. Pra ti também quero me dar assim, sem ordem, mas na necessidade que você tiver. Menino pra brincar, moço pra te dar segurança e velho para segurar sua mão qdo tiver fraqueza. Sem ordem pra passar o dia, ou mesmo a hora. Sou assim desde pequeneninho, já acordei com uma xícara desse pensamento à mão. E sabe que gosto? Meu café esfria de tanto abrir o olho para fora. Mas lá, do lado de fora, o senhor que se apressa aquece meu coração jovem, mostrando que a vida que corre. E insinua que é depressa demais pra eu não cavalgá-la.

terça-feira, 20 de abril de 2010

O que eu encontrei em você


Mas é simples que aquilo mais presente em você não é seu sorriso, seus olhos, sua boca de que eu tanto gosto. Não é seu perfume que sinto aqui, do outro sofá, nem seus cabelos que tanto gosto de tocar. Não são suas roupas, novas, as velhas, as que simplesmente são você, não. O mais presente em você não é seu sorriso, sempre ali, nem sua bondade ou amor que tanto distribiu à quem precisa; mesmo que eu admire isso, não é isso. Sempre que penso em você não sinto aquela saudade de um dia que me tira num simples abraço, nem isso é o mais presente em você. Também ficam de fora o telefonema fora de hora, as surpresas "esquecidas" pela minha casa, os brincos deixados ao lado da cama, ou mesmo sobre o sofá, do lado do copo sujo de Coca. O mais presente de você nem sequer chega a se similar a qualquer coisa que você faça ou seja: o mais presente em você sou eu, que me faço amor para te encher de alegria. 

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Um segredo

Tenho um lugar pra me esconder quando estou com medo. Lembra que costumava ser nos seus braços? Mas hoje me sinto sem eles e preciso de paredes porque não é só medo mais, tenho sentido frio, igual em dias que antecedem a rigoroso inverno. E lembra que era eu quem costumava te esquentar nesses dias? Meu segredo é que sinto mais medo do que nunca e frio, muito frio, mais do que aquele que a gente dava um jeito. E sempre que me sinto assim eu apago as luzes, ponho uma camiseta gostosa, aquela mais velhinha, que trago ainda da juventude, e (risos) ela já quase nem me cabe mais, e os fios soltos, os fios soltos... por nada no mundo os costuro, são eles que vêm me tecendo desde sempre, pelo que me lembro. E só assim o sono tem vindo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

O amarelo que muda um jeito torto de andar

Hoje é fácil, sem complicação, mas tente andar com os olhos fechados pra você ver o que acontece. O amarelo que então coloria descolore e fica preto, mas de novo cheira quando se abre os olhos de novo. Essas flores crescem constante, galhos lisos abaixo, enormes, como quem mostra que precisam de cuidados. E precisam, mesmo cá, em cima: só dá água quando chega de estiagem É quando o dia não corre, o sono vem, e as cores permanecem. Os olhos ardem, pois há tanto se olha para o colorido fixamente na esperança, não sei, deles mudarem de cor e se parecer mais com o seu jeito. E então nota que o "seu jeito" não é jeito algum, não passa de um jeito para se ajeitar as coisas que escorregam pra fora da bacia.  

Sono de vontade

E não é que com sono foi deitar mas caiu mesmo foi de alegria? Acontece que o bocão aberto era vontade de chocolate, e a estrelinha sobre a sua cabeça era de açúcar. Dormia bonito o menino. Eu, do meu lado de cá, sabia que sem aquele garoto não havia esperança, já que era ele quem me alimentava a alma. Que energia que sobrava, dava pra tudo e ainda podia dar pra todos porque não dava para quem quisesse. Era de todo tipo: carinho, atenção, amor são meus preferidos, mas o que mais me alegrava era ao sorriso com tudo, pois ali mostrava que estava tudo bem. Sem correria, chegava sempre na frente. E se acabou a música, saia cantarolando que o rádio sentia dó, que vozinha desafinada, mas que som macio este que vinha do coração. Depois ele cresceu, e só dorme fora de casa. Sabe que um dia volta, tem uma cama quentinha esperando. E sente vontade de tomar café antes de deitar, como igual se acostumou a fazer todas as noites por ai.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

O peso das coisas que dá leveza pra alma

Limpei o guarda roupas, o armário ao lado, a máquina de lavar e um pouquinho do coração, não muito, mas um pouco. O resultado surpreendeu: mesmo pouco, havia muito, e procurei o que fazer com tanto! Das roupas, entreguei a quem eu sei que vai destiná-las bem. Do armário ao lado, foi um pouquinho de conhecimento para algumas pessoas que, se não souber como usá-los, de nada terá adiantado. Da máquina de lavar, um par de pé terá passos muitos para longe a dar. Mas é do pouquinho do coração que me encomoda... por dar, me parece que ele se encheu e não que tenha dobrado de tamanho, não, mas sabe que tá assim, bem fofo mesmo?! Aquilo que não nos serve mais serve bem a alguém, e como isso faz bem a nós mesmo!

sábado, 10 de abril de 2010

É no nascer do sol que se põe certas inquietações

Começa sempre com os passarinhos cantando, mas quando se está com muito sono não se escuta.  E então se acorda antes mesmo do despertador mas aquele rosto lindo, quentinho de sono, diz que não se dormiu. E você diz que dormiu sim, querendo mostrar uma responsabilidade que sequer pensa ter. Na verdade só se quer ficar ali, abraçado no frio,  encolhido, braços cruzados pra esquentar, mangas esticadas pra esconder as mãos, esquentando um pedaço de sono atrasado. Mas, com pressa de viver, sai depressa, esquecendo que já se vive. Então o sol nasce, bem devagar, no horizonte, e aumenta a certeza de que algumas coisas a gente vai deixando pra trás. E pensa se aquilo poderia ser sempre, mas se sabe que nunca mais pode ser igual, porque as coisas não se fazem de novo. E desde já me dá saudade, e desde já vira pensamento que o coração não compreende. E desde sempre fui assim.  

*imagem tirada durante um passeio fotográfico na represa de Rio Preto. Mais imagens em: vistasantiago.blogspot.com

terça-feira, 6 de abril de 2010

Pessoas mais quentes em dias assim

 

Num tempo como este se encontram dois amantes, transgride um adolescente, recai um bêbado em algum canto só. Em todos os casos acompanhava o frio, sinal de um pleno outono sem planos ainda para qualquer outra coisa. Sei que eu quero estar junto a ti, mas se não me vem o amor do oposto, aqui eu tomo a segunda taça sozinho. O vinho é bom, leve, cabernet, me lembra chocolate com passas. Me lembra nossa primeira taça juntos, o seu primeiro gole e, talvez, ainda não sei, minha última vontade de estar contigo. Mais um trago. Me falha a memória. Não lembro mais o ponto de servir, o tempo de repouso antes do primeiro gole, nem mesmo o tempo de repouso antes do primeiro beijo. Acho que não deveria existir. E por isso trago o beijo antes mesmo da vontade, mecanicamente. Mas isto talvez seja a vontade, não o beijo. 

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Quantos desaniversários!

Foi o mais gostoso encontrado, porque era colorido de alegria que só comendo pra saber. Quem comeu mais sabe em dobro do que falo. Dos que mais marcaram essa memória que às vezes me falha, foi um que sai correndo rua a cima. Outro foi histórico: um carrinho de cachorro quente na garagem de casa. Lembro de um presente mole, era roupa, que sequer posso notar se cheguei a usar ou não. Espero que talvez. Dos bolos, eram brancos, de coco. Queria outro na época, mas hoje não sei. A saudade encarece as coisas. Se paga um preço alto pelos amigos longe, pela família já toda mudada, pelas árvores mais baixas e as pessoas que não se reconhece mais. O que aconteceu com aquele universo que eu, criança, via tão grande? Ele encolheu porque eu cresci. E tudo fica menor, assim, até mesmo aquele bolo enorme que hoje ocupa o espaço de um prato razoável. Só a saudade aumenta em desproporção sempre crescente. 

O x da questão

O "x" riscava a questão sobre os Jerivás, que passa frente ao bosque às quartas-feiras de manhã. Por um tempo, olhei, com minha mente sentada, para formar um sentido. Mas era apenas um x sem questão sequer. E fiz do x essa questão presente, que passa ainda pelos Jerivás, que imagino ser um pé de árvore. Trazer o pouco óbvio é um exercício de olhar para o céu numa manhã qualquer, depois de deixar as responsabilidades prontas e terminadas.